quarta-feira, 12 de junho de 2013

"UMA OUTRA ESCRAVA ISAURA:CAPÍTULO 22:"

Depois deste grave incidente em parâmetro residencíal,sinhá Vera continua a vida altiva e combativa,como se nada estivesse acontecido.Ela decide então submeter-se ao "falso pacifismo do casamento de fachada",para satisfazer ao contexto socíal,chegando a seguinte conclusão.
-Foi ótimo acontecer este flagra,porque eu estava ao passo de amá-lo,mas se isto ocorresse esta sim sería a minha fatalidade:amar um homem de estirpe tao desonrosa que não merecería uma gotícula de minhas lágrimas!...-comenta com Virgi Santa,enquanto penteia os seus lindos cabelos na frente do espelho.
-Por isto Virgi Santa,eu a confesso...Sinto por Leoncio três desejos:ódio,desprezo e tara!Somente!A única coisa prestável a que ele serve-me:satisfazer as minhas necessidades carnais de outrora,os meus desejos de mulher e nada mais!Como marido é só uma peça de decoração no meu coração!Alma de pedra!-a confessa,fria e lúcida.
-A sinhá faz bem,muito bem,não ter ilusão!...-a apóia,Virgi.
-Nunca tive,não tenho e nunca a terei minha Virgi!Pois desde antes deste casamento eu já sabia quem Leoncio era!Iludir-me sería uma tragédia!Mas comigo,nunca!Reagir sempre!Sofrer,jamais!-concluí  sinhá Vera,expondo a fortíssima personalidade como poucas.
-Agora vamos passear que é o melhor a fazer minha cara!Ares novos,pensamentos novos!Tudo renovado!Nao sou de ficar condicionada a um só ambiente!Sou uma cigana!Vamos!-pega o seu guarda-sol e é acompanhada por Virgi Santa.
Isaura as acompanha,levando a sua harpa.Quando as três estão embaixo de uma árvore com Isaura tocando o seu instrumento musical,surge uma gata de pelagem negra.Isaura pára de tocar.
-Mirica!A quanto tempo!-exclama Isaura enquanto a gata mia e dá um pulo em seu colo.
-Menina,por onde andavas?!Pensei que já não estavas mais neste mundo!Que já havia partido para outros!-confessa ela,contando às amigas que a felina de estimação estava há um mês desaparecida.
Logo na sequência quem também aparece é a vaca Belém,de raça holandesa,que a sua madrinha Estér deu-a de presente há dez anos atrás.
-Blém!Blém!Blém!Blém!Belém!...-diz Isaura,tocando ao mesmo tempo sua harpa,dando um beijo na vaca,em cujo pescoço há pendurado um sino,segurado por uma corda.
-Olha que auspiciosa!Esta fêmea do touro é muito carismática,Isaura!E consequentemente também muito graciosa!Aliás,ambas,tanto ela,quanto a gata!-as elogia,sinhá Vera,sorrindo.
-O coração de sinhá se derrete todo quando vê as as crianças e os animais...sinhá as adora!-comenta,sorrindo,Virgi Santa.
-E o meu também,Virgi Santa!Pois crianças e animais são puros!É deles o "Reino dos Céus"!-comenta,sorrindo,Virgi Santa.
-Concordo!É verdade!No versículo bíblico está escrito,abrimos as aspas:"No reino do Céu só entrarão aqueles que tiverem o coração puro como o de uma criança",fecha aspas,mas eu acrescentaría!...Entre aspas,"também como os corações dos animais"!Não é decerto?!-as indaga,obtendo "Sim" de ambas,Virgi e Isaura.
-Belchior!Que rosas mais belas!-exclama,Isaura,admirada,referíndo-se ao jardineiro geboso,que passa.
-Pêqui,pêqui,"Isar,rá",é para "prantár" minha "frô"!"Gostô"!"Thão bunita dimais né sô!-a indaga,"assassinando a gramática,sorrindo,ingênuo e desdentado,mancando.
-Estão muito lindas,sim,Belchior!...-o responde,Isaura.
-"Intão,thômi uma prôcê!"-a oferta.-Uma "rosária cú amô pra uma outra frô"!"Thômi Isar,rá!"...-a dá outra.
-Muito obrigada,Belchior!Muito gentil de vossa parte!Mas eu as devolverei para que você as plante de coração,e elas passam brotar e multiplicar maravilhosamente para a natureza!-o devolve.
-"Num vou aceitá,não,sô!""Venha plantá cumigú"ó,"Isar,rá!"-nega a devolução e a sugere que venha com ele plantá-las.
-Pedido aceito,seu Belchior!Vamos sinhá Vera e Virgi Santa,olhar-me plantá-las!-as convida,com as rosas nas mãos.
E assim desta maneira elas acompanham-na,junto a Belchior,para testemunharem o plantio das rosas no jardim.Assim que concluí o plantio,Belchior vai embora,enquanto elas permanecem,até que Isaura as revele.
-Voces lembram-se daquela rosa tirada do alto de uma árvore,por um tiro certeiro,e que me foi ofertada por Camilo?Nem precisam responder-me,visto que foi algo inesquecível!...-insere a resposta,sequêncialmente,diante da própria indagação,Isaura.
-Pois então minhas amigas!Eu a plantei e virou esta roseira muito linda!É a "Roseira do Amor"!...-as revela,muitíssimo satisfeita pelas suas "mãos divinas".
-Sim,bravo,Isaura!Bravo!-a aplaude sinhá Vera.
-Roseira esta símbolo de vosso amor para com Camilo e vós mercê,Isaura!Fantastic!-a elogia,sinhá Vera,inserindo ao término um leve e charmoso estrangeirismo francês.
-E quão lindo este amor que dá-me vontade de chorar!...-simula sinhá Vera,pegando o seu lenço,inseríndo ironia maravilhosa.
-Não finja Vera!Só se for choro de alegria!Pois há algo mais feliz do que amar?!-percebe e a declara,Isaura.
-Decerto que não,Isaura!Como vós mercê é afortunada!A vida presenteou-te com um grande amor!Nao há nada mais benfazejo do que isto!Agradeça aos Céus!-ajoelha-se sinhá Vera,entrelaçando as mãos e as erguendo para a paisagem celestial.
Enquanto elas sorriem não imaginam que uma "cobra peçonhenta" está bem próxima delas,à espreita,escutando toda a conversa,deitada sobre a terra,escondida atrás das plantas que há perto da roseira.
-Isaura não perde por "isperá"!Agora "mesmú" vou "acabá" com esta "filicidadi"!-trama a serpente com olhos enviesados.
E imediatamente põe-se a contar,escondida atrás da cortina,do gabinete de Leoncio,para este tudo o que acabou de escutar.
-Muito bem Rosa!Muito bem!Mais tarde nos encontraremos na "Cabana de Pai Tomás"!Agora vá!-a dispensa,sentado em frente ao gabinete,enquanto escutava Rosa escondida na cortina,atrás dele.Tudo bem ocultado.
Leoncio assim concluí:obtém a confirmação daquilo que desconfiava:Isaura está mesmo vivendo um romance secreto,feliz e apaixonada,como aquele sonho lhe avisara.É claro que,mais rápido do que possam imaginar,ele destruirá o namoro entre a escrava de seu pai e o primo da esposa.
Quando se vê chegam na "Fazenda Santa Genoveva" uma manada de búfalos que Leoncio comprou lá em Pernambuco de um certo "Barão da Borracha" paraense,o "Barão de Mauá",fechando um negócio vultoso.
-Os búfalos são dóceis,trabalham muito e possuem carne saborosa!Isto sem falar na qualidade do queijo e do leite da búfala!Um animal fabuloso!-elogia Leoncio,explanando sobre os animais diante de feitor Cipriano e alguns escravos.-E conto-lhes ainda mais:estes animais são originários da Índia,e conta a lenda,segundo o "Barão de Mauá",que um navio cheio deles afundou no oceano,bem em frente ao "Arquipélago do Marajó",no Pará!-explica baseado no teor geográfico.-Foi assim que nadaram e pararam lá,adaptando-se muitíssimo bem ao clima da "Amazônia Marajoara",passando a servír às fazendas de engenho daquela região,para deleite dos caboclos,índios,negros e europeus que povoam aquele específico território!-concluí,brilhantemente Leoncio sua explanaçao,mostrando ser um excelente geógrafo-vilão ou "crápula cultural".
Até que feitor Cípriano inevitavelmente indague-lhe:
-"Sinhôzinho" Leoncio,mas eles estão prontos para adaptar-se ao clima daqui do Sudeste?-pergunta-lhe.
-Sim,Cipriano!Senão eles não estarião aqui!Os búfalos são bastante resistentes,tanto ao frio,quanto ao calor!Daí que até no "Pólo Norte" poderião ser criados...-exagera.-Ironias à parte...Mas,enfim,eles podem dar-se bem em muitos dos lugares...-dá-lhe a resposta.
-E para comemorarmos a estréia desta espécie "bufalêsca" em nossa fazenda,vinho à vontade,para todos!Mas só hoje!Aproveitem!-ordena Leoncio,mostrando um raríssimo momento de indulgência para com os escravos.
Passam-se as horas.Lua cheia no Céu,bastante estrelado.Rosa e Leoncio estão deitados sobre uma cama com colchão de palha na "Cabana do Pai Tomás",quando confidencia-lhe a cobra.
-"Amanti",tú sabe que sinhá Vera conseguiu a confissão de Isaura,de que por ti sempre foi assediada,que ela namora "iscondida ú primu di" tua "mulhé",o tal de Camilo e chegou até a "plantá" uma rosa "qui eli" deu pra ela,tirada a bala do topo do bacurízêiro!"I qui" sinhá tua "mulhé acôita u romanci dus" dois,"juntu cum" Virgi Santa,que levam Isaura e sinhá "Isté",que também "acôita",lá pra casa-"grandi du" irmão Henrique pra "si encontrá cum" Camilo,que também mora lá!...-resume a invejosa as últimas espionagens em relação à vida de Isaura.
-"I ú sinhô meu amantí num" faz nada!-o indaga.
Após ouvir tudo calado,Leoncio pronuncia-se.
-Calma Rosa!É só um jogo!Finjo que não estou nem aí,para dar o grande bote!...-a confessa.-Ou tú não sabes que o inimigo somente ataca quando a vossa poeira abaixa?!...-a ensina,maliciosamente e malignamente nato.Rosa assim concluí que algo muito maligno ele prepara.É lógico que por enquanto nada a pode confidencíar...
É outro dia.Caí uma chuva fina sobre "Campos dos Goytacazes".Nao demora para que ela cesse,as nuvens negras dissolvam-se pára rapidamente aparecer todo o esplendor de um céu límpido e ensolarado.Como sabe que sinhá Vera tem o hábito,em companhia de Virgi Santa,de conversar com Isaura,todas as manhãs,ao visitá-la em seu quarto,saíndo as três para tomar o café da manhã,Rosa tem a maligna idéia de esconder-se embaixo da cama de Isaura,poucos minutos antes dela acordar-se,para saber o que elas vão dialogar.
-É hoje amigas Vera e Virgi Santa!Que encontrar-me-ei com o meu amado,no bacurízêiro...Estou muito feliz e não vejo a hora de estarmos lá!...-confessa,Isaura,na cama,sorrindo e entusiasmada,sem saber que Rosa escuta tudo embaixo da mesma,com olhos enviesados.
Quando se vê,Rosa saí rapidamente do quarto assim que vê as três saírem do mesmo para tomar o café da manhã.Rapidamente,em poucos minutos,ela está escondida por de trás da árvore.Pronta para espionar.
-Amanhã Isaura,a mesma hora,estarei pensando no nosso encontro,muito ansioso para chegar às 7 da noite,lá naquela cabana...-a comenta Camilo,após um beijo.
-Sim,na "Cabana do Pai Tomás"...-revela.-Estou desde agora tão ansiosa quanto você meu amado!...-o beija,totalmente tomada pelo espírito magnificamente amoroso -só recorrente aos afortunados apaixonados.
Rosa pega na boca e invejosa,fala.
-An!"Intão" é lá "qui êli" vai a "deflorá"!...-malda.-Mas não sem "antis" eu "contá prú" meu "amantí"!...-planeja,sórdida.
E é durante a noite que Isaura dormindo tem uma espécie de pesadelo premonitório:sonha que a "Morte" estilizada com capa preta,rosto de esqueleto e foice em uma das mãos,mascarada,põe fogo em um caixão,enquanto ouve gritos lancinantes de um homem.Isaura acorda,suada.
-Meu Deus!É horrível!O que este pesadelo quer dizer?!-indaga-se com o livro "Amor de Perdição" aberto sobre ela,de autoria do namorado,Camilo Castelo Branco,o escritor português.-Gritos de dor,um caixão em chamas e a "Morte" ateando fogo ao mesmo,mascarada...Será que alguma tragédia me ocorrerá?!Deus me livre!-faz o "Sinal-da-Santa Cruz",levanta-se e prostrada,diante do oratório,começa a rezar.
Coincidentemente,Camilo Castelo Branco teve o mesmo pesadelo que molestou o sono de Isaura.Concluí:uma tragédia ocorrerá.Nao sabe-se com quem,a que horas,a que dia,o algoz,enfim não poderá adivinhar.Enquanto o sórdido Leoncio,comendo uma maçã,deitado em sua cama,confabula.

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