-Estás vendo esta rosa,Leoncio?!Estás vendo,claro!Ela está murchando,e é exatamente assim que encontro-me agora:murchando de desgosto pela tua desonra de carácter!Tua torpeza d'alma!Isaura não merecia isso,jamais!Como tú és vil!É por isto que quero agora,que vá te embora que eu por enquanto,por um bom tempo não quero mais ter a visão de tua pessoa!Seu crápula!-o joga a rosa murcha no rosto.
Bufando de ódio,assim que a mãe dá as costas,Leoncio pisa na rosa murcha com a bota,dizendo em tom baixo.
-É assim que farei com Isaura!Vou espezinhar,espezinhar,espezinhar!Ela há de me pagar,por ter delatado-me!Isto não ficará assim!-promete vingança contra a linda escrava loura dos olhos azulados,corpo de sereia,voz adocicada e beleza de deusa:uma "Afrodite do Engenho".
Agora Isaura e Estér estão rezando no oratório,fervorosamente à "Virgem de Nazaré",para que a santa faça Leoncio mudar,converter-se a Deus e deixar de ser influenciado por atitudes más.Sinhá Vera aprova a atitude da sogra,e não faz nada para Leoncio não ír embora.Enquanto isso o crápula finge que vai embora,ainda permanecendo na fazenda,no sótão.É lá que ele trama algo.Pede para Rosa dizer ao cochêiro que não vá embora.
-Como que de costume Rosa faça tudo o que eu ordeno,que tú só tens a ganhar!-fala,dando-lhe um beijo nos seus lábios carnudos.
-"Inhô,nhô mandô isperá" na cavalariça que daqui a meia-hora ele volta,pra tú "levá eli" pra "cidadi"!"Num" vai "imbora" não "qui eli" já vem!-passa a ordem.
Como uma cobra,Leoncio abre levemente a porta do quarto de Isaura,adentrando ao seu recinto de descanso.Ele umedece um lenço negro no frasco do éter e a obriga cheirar,dormindo.Ela fica desacordada.Levando-a em seus braços,Leoncio assim a rapta,sequestra Isaura,levando-a na carruagem para a Côrte.Ele suborna o cochêiro,dando-o algumas patacas para que ele não conte nada.Na chácara residencial,Leoncio mantém Isaura aprisionada no quarto de hóspedes.
-Daí tú nao vais saír,enquanto eu não te libertar!-diz o louco ficando sentado numa cadeira na porta do quarto,enquanto bebe várias taças de vinho,tornando-se um homem embriagado,chegando a chorar pela sua obsessiva paixão e pelo ato de Isaura o repugnar.
-Porque tú não me queres Isaura,se posso fazê-la a deusa do meu harém,a sereia do meu mar,a rainha do meu castelo,a figura máxima de meu palácio?!Como podes renuncíar ao meu amor,ao meu dinheiro que a tudo para ti pode comprar,até tua liberdade?!Miserável!Sua miserável!Eu te odeio!Eu te odeio!Porque te amo e tú não me queres amar!-vocifera e dá vários socos na porta batendo-a com violência,acordando a Mãe Joana,que acolhida em seu quarto,só lhe resta rezar,"pro demônio saír do corpo dele".
A reza de Mãe Joana é forte e Leoncio cochila por alguns minutos,ao mesmo tempo que Isaura acorda.Mãe Joana rapidamente tira a chave da fechadura e a coloca para o quarto,por debaixo da porta.Ela logo vai embora de volta para os seus aposentos.Isaura como não lembra-se como do engenho foi parar ali em seu quarto,na Côrte,concluí que por Leoncio foi raptada,olhando pelo buraco da fechadura que o crápula encontra-se cochilando na porta de seu quarto,entendendo que Mãe Joana aproveitando-se deste seu estado,para salvarguardá-la põs a chave por baixo da porta para que Leoncio não consiga entrar no quarto e importuná-la.Isaura fica apreensiva,encolhida na cama,embrulhada no lençol.Não pára,com os lábios,de rezar em silêncio,com a chave em mãos.Pára,ajoelhada no oratório,continuar a fazê-lo.Leoncio acorda do cochilo,a confessando.
-Isaura,tú és a razão de meu viver,mesmo que tú não me queiras,por desgraça!Tú não me aceitas,tú não me aceitas Isaura,desabando o Céu sobre mim!-confessa,chorando,embriagado,não demorando para que o pústula,dominado pelo sono,opte por dormir no assoalho,após olhar rapidamente para a fechadura e fechar os olhos,abrindo-os ao raiar do sol,exatamente às 6 da manhã,e ao perceber que a chave não está mais ali,acorda-se furiosa e recomeça a bater na porta,perturbando a Isaura,claramente.
-Abra esta porta,Isaura!Abra esta porta!-brada.-Eu faço questão que tú abras,para que sirvas ao teu senhor,minha escrava!-ordena,fazendo Isaura acordar-se,assustada,afrontando-o.
-Eu não abrirei!Nem que o sol desabe sobre esta casa!Eu não abrirei ao louco devasso que deseja atentar contra a minha pureza,vilipendíar a minha castidade!-o afronta,segurando um crucifixo.-Que Deus o castigue,o exorcize e mande a sua horda de demônios,que apossaram-se de vossa alma,para os lugares mais infinitamente longínquos do abismo!...-continua a afrontá-lo.-Por isto,por misericórdia,pare-me de atentar-me!Vá embora!Esqueça-me!Vá descansar!-roga-lhe,tentando sugerí-lo que a deixe em paz.
-Então nao abrirás por bem!Pois então tú escolhestes o teu opróbrio:vais receber-me por mal!-tenta retirar a chave do bolso de sua calça,mas ao não encontrá-la(pois não lembra-se que esqueceu-se dela fincada na fechadura do lado de fora),pensa que a mesma foi furtada por Isaura.Só que friamente tira uma cópia da mesma guardada na bota do pé esquerdo,mostrando ser um vilão prático e prudente,claro,para com a execução,e ante,premeditação de suas maldades.Isaura ouve o barulho da chave na fechadura.Levanta-se rapidamente,após deixar o crucifixo no oratório,pegando um vaso de porcelana.Quando Leoncio abre a porta,disposto a violentar Isaura,esta encontra-se escondida atrás da porta aberta,pára às costas dele,quebrar-lhe o vaso na cabeça.Ele desmaia.É aí que mais-do-que-depressa,Isaura retira-se da Chácara,fugindo em disparada.É aí que por uma carrruagem é atropelada.Um rapaz desce imediatamente para socorrer a moça.Eles olham-se fixamente,para Isaura em seguida o pedir-lhe,prostrada aos seus pés,lagrimando.
-Pelo amor de Deus,leve-me daqui em sua carruagem,que estou fugindo de um crápula!Este é o principal socorro,o qual pode promover-me!Senhor!Por misericórdia!-o implora,pegando em suas mãos,sobre o chão.
-Sim,claro!Minha sinhorinha!Deixa eu ajudar-lhe!-prontifica-se imediatamente o cavalheiro,e a carrega nos braços,colocando-a na carruagem.
Enquanto isto,no engenho,sinhá Estér,sente a ausência de Isaura.
-Por onde anda a minha menina?Ela nunca fez isto!-observa.
Até que alguém passe-a uma mensagem,chegada por pombo-correio.Eis o teor da mesma,abaixo:
"Leoncio raptou Isaura,levou-a para a Côrte e ela fugiu da chácara".
-Desta vez Leoncio foi longe por demais!É um escandalo!E de âmbito social sem proporções!Que Vera há de saber!-e corre até o quarto da nora para mostrar-lhe o teor do bilhete.
-Meu Deus!Que troça de Leoncio para conosco minha sogra!-espanta-se,revoltada.-Escarnecendo-nos,ridicularizando-nos perante toda a sociedade!Tornando-se até um raptor de moças!Que horror!-concluí seu queixume,após ajoelhar-se diante de sinhá Estér,enquanto esta afaga-lhe a cabeça com a mão direita,segurando um terço,consternada,no salão principal da casa-grande.
-Que desgosto!Que desgosto Vera,Leoncio está a provocar-me!-acrescenta.-Agora Isaura deve estar a sofrer...na iminência da sarjeta!Se já não o está!...-tece seu rosário de lamentos,no salão,respondendo a continuidade dos queixumes de Vera,enquanto começa a chover.-Que opróbrio "Nosso Senhor Jesus Cristo"!Que opróbrio!Livre a minha Isaura daquele crápula!-também vale-se de seu queixume,sinhá Estér,só que agora no interior da carruagem que para o caminho da Côrte as levará.
À estas alturas na Côrte,Leoncio mente na delegacia em torno da fuga da escrava,sempre dissimulado como o é conveniente,visto que seu perfil condiz com o de um canalha frio e calculista.
-Ela colocou sonífero no meu chá de camomila,que já é um calmante natural,e foi-se fugida,aproveitando de meu estado letárgico!-mente.-Ela veio comigo para servir-me de mucama na Côrte!-prossegue com suas mentiras advindas de sua baixeza de carácter.
O delegado Orlando Bitar,questiona-lhe:
-Mas senhor Leoncio,vós mercê não está precipitando-se?!A escrava pode ter voltado para o engenho,para debaixo da saia de vossa mãe!-ventila-o esta possibilidade.-Se vós mercê írdes até lá,e não a encontrar,aí,sim,a fuga da escrava há de se confirmar!Enquanto isto,resta-nos esperar...-diz entre uma baforada e outra de seu inseparável cachimbo de prata.-Um acréscimo de nova pergunta:porque se ela veio de livre e espontânea vontade,porque decidiu fugir de vossa companhia?-o indaga,desconfiado.
-Ora,ora delegado!Porque é uma fingida!-o responde,sempre falso,mas inteiramente persuasivo.-Disse-me que veio de bom grado e quando vejo sinto que foi à contra-vontade,enganando a mim e a sí própria!-cria nova mentira,fumando também seu cachimbo,só que de ouro,com as inicíais "LA".
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